quarta-feira, 5 de maio de 2010

O exílio do sagrado e da ética na crise da modernidade (sinópse)

José de Deus Luongo da Silveira (Org.)

1. RELEVÂNCIA DO TEMA: A ética e a crise da modernidade tem sido um dos temas mais discutidos na atualidade. E a discussão se aprofunda quando nem ao menos temos um princípio geral de definição de modernidade. O que é a modernidade (...?). Não sabemos! Ela é a fusão do múltiplo, do heterogêneo, do fragmentado, do efêmero, onde se envolve atividade racional, científica, tecnológica e administrativa. Basicamente, existem duas figuras condensadoras da modernidade: a racionalização e a subjetivação.
   “Racionalização e subjetivação aparecem ao mesmo tempo, como a Renascença e a Reforma, que se contradizem, mas se completam ainda mais[1]” [...] “O drama da nossa modernidade é que ela se desenvolveu lutando contra a metade dela mesma, fazendo a caça ao SUJEITO em nome da ciência, rejeitando toda a bagagem do cristianismo que vive ainda em Descartes... (destruindo) a herança do dualismo cristão e as teorias do direito natural que haviam provocado o nascimento das Declarações dos direitos do homem e do cidadão nos dois lados do Atlântico[2]”. A modernidade precisou matar o SUJEITO para triunfar. No plano da ética, o problema se torna bem mais crucial. A pergunta a ser feita, hoje, é se os valores éticos se constituem em padrões uniformes, imutáveis e universais ou devemos ter regras casuísticas de conduta? Devemos adotar a subjetividade ou a objetividade axiológica? A absolutividade ou relatividade dos valores éticos? A sua Igualdade ou hierarquia?
     Esses questionamentos permanecem ainda insolúveis, temos mais de três séculos de discussão sobre o triunfo da razão e o esboroamento das tradições ocidentais. E AGORA, o esgotamento da modernidade se transforma em sentimento de angústia e desencantamento do mundo. Surge a secularização e a separação entre o mundo dos fenômenos (da técnica) e o mundo do ser. De acordo com Habermas e a concepção weberiana, não nos aprisionamos mais em uma jaula de ferro. Contudo, parte da filosofia não se engaja na discussão do mundo novo, parte da filosofia permanece arrebatada na contemplação dos grandes pensadores, sem trazê-los para fermentar a realidade do cotidiano. Mudaram os mitos, apagaram-se as luzes e alguns pensam que a filosofia ainda pensa controla a situação. Na figura do burguês decadente, a filosofia [...] segue enfadonha e cansadamente o seu caminho como se nada tivesse mudado. Como uma idosa viúva que, falida e depauperada, vivendo numa decadente mansão, caindo aos pedaços no limite da cidade, ainda faz de conta que sua família continua controlando a cidade...[3].
    Com a modernidade, a ciência se isolou de qualquer referência à religião, decretando o exílio do sagrado, como se a única resposta para o homem se condicionasse ao discurso científico. A ciência moderna está empenhada em transformar o mundo com novas tecnologias, mas para que mudar o mundo se a ciência ignora o homem com suas crenças e valores? De que servem todas as conquistas científicas se não para benefício do homem? E onde está o encontro da ciência com os valores humanos?
    Contudo, surgem as reações antimodernistas com Nietzsche, Freud, a Escola de Frankfurt, Michel Foucault e outros. Já no começo do séc. XIX (1818 – em “O Mundo como vontade e como representação”), Schopenhauer se distancia do mundo da razão e da técnica e afirmando que é preciso destruir o EGO, a ilusão da consciência e da ordem social, da racionalidade desenfreada do neoliberalismo.
     Nietzsche combate Schopenhauer, mas adota a sua crítica individualista. Ele se coloca no interior da modernidade, reivindica a herança iluminista, particularmente de Voltaire, sobretudo pela reação volteriana ao cristianismo. No terceiro capítulo da obra A Gaia Ciência, Nietzsche (2002), nos deixa carregados de culpa, quando diz: Deus está morto. Nós o matamos. Deus permanece morto. E fomos nós que o matamos. Como nos consolar, nós, os assassinos dos assassinos? Aquilo que o mundo possuía até agora de mais sagrado e de mais poderoso perdeu seu sangue sob nossos punhais. Quem limpará esse sangue de nossas mãos? Que água lustral poderá jamais nos purificar? Que solenidades expiatórias, que cerimônias sacras precisaremos inventar?” [...] E continua: Quem quer que nasça depois de nós pertencerá, em virtude dessa mesma ação, a uma história superior a tudo o que foi história até agora!
      Ao continuarmos a reflexão dessa problemática, convém nos situarmos dentro do contexto relacional da modernidade, do neoliberalismo e da globalização, para melhor trabalharmos o tema da ética e da crise da modernidade.
2. A MODERNIDADE QUE TRAZ EM SEU BOJO O COGITO CARTESIANO, pelo excesso de racionalização, se instala no plano político-econômico com o neoliberalismo e a globalização, funcionando como a ditadura extremada da razão e a morte do SUJEITO. Como se sabe, o Neoliberalismo nasceu depois da II Guerra Mundial, na Europa e nos EEUU, como uma reação teórico-política ao Estado Intervencionista do Bem-Estar Social. O Estado do Bem-Estar Social surgiu no início do séc. XX, mas só se desenvolveu após a II Grande Guerra, se caracteriza pelo intervencionismo estatal em setores que antes eram reservados aos cidadãos, como setores econômicos estratégicos, siderurgia, energia, petróleo, telefonia, empresas, redação e distribuição de jornais. No Rio de Janeiro o Estado Brasileiro era responsável até por lojas de confecção de roupas, etc.
3. O TEXTO-BASE DO NEOLIBERALISMO é “O caminho da Servidão”, de Friedrich Hayek, de 1944, no qual se atacavam os mecanismos de mercado, tendo como alvo o Partido Trabalhista Inglês, nas eleições de 1945.
4. SE FIZERMOS UMA RETROSPECTIVA DOS PARADIGMAS ESTATAIS, o primeiro grande paradigma estatal é o Estado de Direito ou Estado Moderno que surgiu no séc. XVIII e se caracterizava pela mínima intervenção do Estado; o modelo liberal de Estado é substituído pelo Estado do Bem-Estar Social, grande, lento, ineficiente, draconiano, paquidérmico e injusto; na década de 70 surge o Estado Democrático de Direito que não abandona os paradigmas anteriores, simplesmente incorpora novos direitos, como os direitos difusos, direitos ambientais, do consumidor, etc.
5. CONSOLIDOU-SE O NEOLIBERALISMO na Inglaterra, com Dama de Ferro; nos EEUU com Reagen; no Chile com Pinochet; na Bolívia com Banzer e Paz Estensoro; no México com Salinas; na Argentina com Menen; na Venezuela com Andréz Peres; no Peru com Fujimori; também no Japão, na Coréia, em Singapura, na Malásia e no Brasil aparece com Collor de Melo, etc. Na União Soviética, em nome do neoliberalismo, a Perestroika de Gorbatchov, retirou a Rússia do comunismo e a entregou à máfia russa.
6. A NOVA VIRADA DOS ANOS 70 e 80 acelerou a industrialização, a aquisição de novas tecnologias, crescimento dos mercados. O Neoliberalismo tornou-se uma superestrutura ideológica e política que acompanha as transformações da história do capitalismo moderno.
7. O NEOLIBERALISMO E A MODERNIDADE ROMPEM COM AS ESTRUTURAS CONCEITUAIS DO PASSADO e se apresentam como uma visão nova da realidade, “como (um) sistema unitário de conhecimento autocentrado na subjetividade[4]”.
8. É IMPOSSÍVEL ESTUDAR O NEOLIBERALISMO SEM EXAMINAR OS PRESSUPOSTOS DA MODERNIDADE. A modernidade, onde se insere o Neoliberalismo é uma perspectiva de superação do paradigma ontológico, cujo embrião nasceu na Reforma Protestante e do Renascimento, toma corpo e se acentua nos diferentes saberes e nas artes.
9. PARA EXPRESSAR ESSES NOVOS TEMPOS fala-se em termos, tais como, fase pós-moderna, pós-industrial, pós-cristã, pós-quebra de paradigmas, etc.
10. O NEOLIBERALISMO E A MODERNIDADE SÃO UMA RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO CAPITALISMO, que rompe com o passado e se articula num horizonte aberto, onde sempre cabem novas abordagens, geralmente megalomaníacas.
11. PODEMOS ENTENDER A MODERNIDADE COMO A FRAGMENTAÇÃO DOS PARADIGMAS ESTABELECIDOS (construídos em unidades fechadas), que se abrem, sem medo, em direção ao novo, ao desconhecido. Há, inclusive, nesses novos tempos, o desejo incontido de avançar, de transpor limites, de sair do convencional, de se expor, de correr riscos, de ser diferente.
12. É A NOVA DIÁSPORA, grupos humanos dispersos que tomam consciência de suas finitudes, de estarem aqui e agora imersos na existência e querem respostas, querem sair dos guetos tradicionais do pensamento ocidental e se aventurarem em direção a novas estruturas conceituais. Nesse sentido, a modernidade parece ser a maioridade da razão, ou quem sabe, o atrofiamento da razão, com a desumanização do homem.
13. A PARTIR DESSA PREMISSA, A MODERNIDADE É UM MARCO OUSADO, A ENCRUZILHADA DA RAZÃO, ou a forma de re/inventar novos corredores de pensamento que satisfaçam os questionamentos. São novas leituras do mundo.
14. A GLOBALIZAÇÃO É FILHA ADULTERINA DO NEOLIBERALISMO: Com o advento da globalização, fala-se numa multiplicidade sígnica: multimídia, desterritorialização, transculturação e reterritorialização, que faz com que o homem do povo se torne um mero expectador, que não entende o enredo, mas assiste ao espetáculo. Apenas sabe dizer/falar o nome dos novos deuses, mas desconhece o esquema comunicativo do discurso, ele consome o pacote pronto.
15. FALA-SE NO FIM DA HISTÓRIA E NO FIM DA GEOGRAFIA[5]. A geografia passa a ser a dos países centrais ou produtores e países periféricos ou consumidores; a história passa a ter o caráter de contemporaneidade e não-contemporaneidade. Assim, tempo e espaço possuem novas dimensões epistemológicas.
16. SURGEM OS NOVOS MITOS: o mito da certeza racional (a razão torna-se o único instrumento para conhecer a verdade). O mito da cientificidade, do progresso, consumismo desenfreado, da subjetividade, etc. Na modernidade, os mitos que criamos foram deixados sem controle e tornaram-se loucos. Eles povoam o nosso cotidiano. Aqui se pode estabelecer a diferença entre alienação e consciência crítica (...?).
17. O IMPACTO DO NEOLIBERALISMO NA CIDADANIA E NAS DEMOCRACIAS LATINO-AMERICANAS: O impacto negativo sobre os povos da América Latina; relativização da democracia e da soberania nacional dos Estados; pobreza, miséria e exclusão social; criando duas figuras: subcidadãos x sobrecidadãos ou os subintegrados x sobreintegrados; criando a febre privativista (entreguismo ao capital internacional); duas sociedades irreconciliáveis: pobres e ricos; império do mal com enormes custos sociais; egoísmo racional e individualismo solidário; submissão ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional o que conduz ao atraso econômico dos países pobres. A Dívida Interna Brasileira atinge a cifra de 600 Bilhões de reais, ultrapassando 50% do PIB. E a Dívida Externa Brasileira passa de 300 Bilhões de Dólares. Só em 2001, o Brasil pagou US$43 Bilhões aos credores internacionais, sendo que a dívida “per capita” é de US$1.387 dólares. Dentro desse contexto, o neoliberalismo é uma espécie de canibalismo, onde o grande e forte se alimenta do pequeno e fraco.
18. A CRISE E O FUTURO DO NEOLIBERALISMO: O futuro do capitalismo será o próprio capitalismo, mais desumano, selvagem, predador ? Haverá outra perspectiva possível, quem sabe o fim do eurocentrismo e do centralismo dos EEUU? De qualquer forma é inegável admitir que, o Neoliberalismo sobrevive pela incapacidade das esquerdas. Para Perry Anderson o pós-neoliberalismo pode desembocar no neo-socialismo.
19. COM O NEOLIBERALISMO E A GLOBALIZAÇÃO, com a idéia de países produtores e massa consumidora, despersonalizada, como adaptar a essa realidade às necessidades de afirmação do individuais? Segundo, Touraine (1994), o homem moderno está ameaçado pelo poder absoluto do EGO, pela idéia de massa, pelo totalitarismo da sociedade de consumo. O pensamento contemporâneo está marcado pela luta entre o Ser perdido e o ser-no-mundo, entre o niilismo triunfante depois da morte de Deus, do logos divino e das idéias platônicas e a idéia de homem como portador de tradição, de cultura e de história. Com a demolição do pensamento anterior, do SER PERDIDO, se cria algo novo, que não é o EGO individual (identificado como razão, que é conservador, medieval, carregado da idéia de rebanho, de massificação) e também não é o SI-MESMO (SELF), construído pela sociedade, mas a emersão do SUJEITO. A partir de Nietzsche e Freud o indivíduo deixa de ser concebido como trabalhador, consumidor, cidadão, deixa de ser um ente social e se torna um ser de desejo, em Ser individual, um SER privado. O SUJEITO é redefinido: não está mais ligado a Deus, a razão e a história. Deus está morto, a razão se tornou instrumental e a história está dominada pelos Estados Unidos da América e pela União Européia. “O SUJEITO também não é a alma em oposição ao corpo, mas o sentido dado pela alma ao corpo, em oposição com as representações e as normas impostas pela ordem social e cultural[6]”.
20. A PASSAGEM DO INDIVÍDUO, AO SUJEITO E AO ATOR: “O SUJEITO é a vontade de um indivíduo de agir e de ser reconhecido como ator[7]”. O indivíduo é a unidade particular onde se misturam a vida, o pensamento, a experiência e a consciência. O SUJEITO é a passagem do id ao ego. O EGO é construído pela cultura e mata as possibilidades do SUJEITO. O EGO é o indivíduo consumidor que se submete às instâncias do Estado. O EGO é a afirmação como experiência de massa, reforça a inação das diferenças, fica preso ao sistema. Ele conserva a modernidade, mas não a transforma. Nesse caso, como recuperar essa falta da dialogicidade entre a razão e o SUJEITO? Se de um lado, o SUJEITO sem a razão se fecha na obsessão de sua identidade e, de outro, a razão sem o SUJEITO se torna instrumento de poder? Parece que a resposta está no próprio SUJEITO, O SUJEITO paira sobre tudo, está suspenso entre o céu e a terra, em constante construção, recria as suas razões ou ele deixa de ser SUJEITO, deixa de ser ATOR da história e volta a ser o indivíduo, isso porque a idéia de SUJEITO não pode ser separada da idéia de ATOR SOCIAL. O ATOR, por sua vez, é o inverso do SI-MESMO, porque é aquele que em vez de desempenhar os papeis que correspondem a seu status, constrói o campo social a partir da subjetivação. Não existe ATOR sem SUJEITO e não existe SUJEITO sem ATOR. O SUJEITO é uma reflexão do indivíduo sobre a sua própria identidade, por isso a idéia de SUJEITO está na contra-mão do pensamento moderno, está na contra-mão do neoliberalismo e da globalização . A subjetivação é a transformação do indivíduo em SUJEITO. Em Michel Foucault a subjetivação é uma forma de sujeição, com o aparecimento da idéia de construção do ‘homem interior, psicológico’. O SUJEITO não é impessoal, como Deus, a razão, a história. Nessa mudança, o EGO se parte em dois: de um lado o SUJEITO (associado à liberdade, à visão crítica do mundo) e de outro, o SI-MESMO (SOLT) (associado à natureza e a sociedade, o SI-MESMO é mera reprodução da realidade). O SUJEITO descobre que na ética, entre a lógica do bem e do mal, existem condutas neutras, técnicas, rotineiras, mas o bem e o mal aparecem desde que uma conduta seja social, desde que ela vise modificar o comportamento de um outro ATOR SOCIAL.
21. A ÉTICA E A RELIGIÃO SÃO ESPAÇOS DE EXPERIMENTAÇÃO DO SUJEITO: A modernidade é a ruptura com o sagrado, é o dilaceramento do sagrado, a perda da idéia de mistério, da linguagem inconsciente, algo que está mais além (o ainda não), que se constitui numa ordem simbólica, num campo aberto a vários campos de sentido. Por isso, nunca se esgotam as possibilidades de interpretação dos símbolos religiosos, eles são arquétipos com cunho transpessoal e estão na raiz da nossa experiência existencial. Ao entrar na modernidade a ética e a religião entraram em crise, uma vez que na sociedade da técnica não há mais lugar para a tradição. Para sobreviver na modernidade, a religião e a ética necessitam adquirir a idéia de SUJEITO, algo semelhante à experiência amorosa, que descobre a subjetividade. Sendo assim, a religião e a ética se transforma em uma âncora de resistência à modernidade avassaladora. A religião e a ética ao ousar sair do EGO individual, forçam a emergência do SUJEITO, deixando para traz o espírito de rebanho que é a conservação do EGO, conservação do indivíduo preso no contexto sócio-cultural.
22. DIRÃO QUE ESTOU FALANDO MUITO POUCO SOBRE ÉTICA e muito sobre as estruturas do pensamento que perpassa a modernidade. Contudo, o que é a ÉTICA, a exteriorização da conduta, se não aquilo que, no nosso âmago, acreditamos como certo, não porque os outros dizem que é conduta correta, mas porque a nossa interioridade nos dá essa certeza? Enquanto permanecermos no EGO construído pela nossa cultura não a possibilidade de uma catarse individual, da descoberta de algo que é nosso, como a construção do SUJEITO que recria as suas razões. A modernidade já foi muito longe. A modernidade matou Deus. Em Nietzsche “Deus está morto”. Foi o que aconteceu com a religião, a racionalização da realidade destruiu o marco referencial da fé, destruiu as distinções entre o temporal-espiritual, e natural-sobrenatural. A modernidade pensa que superou o dualismo entre o sagrado e o profano, negando o sagrado, como um enxerto artificial que se insere na realidade da vida. A modernidade esqueceu que o sagrado não é distinto do cotidiano, não é um não-mundo ou um antimundo. Quando Tertuliano diz que “acredito porque é impossível”, está querendo dizer que a há um ponto de conexão, onde a razão não chega sozinha. Está querendo dizer que o homem necessita da sensibilidade, da emoção e do mistério, tanto quanto a razão. Necessita de algo além de toda a esperança humana ou “o sucesso prometido além de todos os fracassos”[8]. É impossível alcançar uma definição exata desse “acredito por que é impossível”, de Tertuliano; e o melhor que podemos fazer é sugerir uma abordagem "em torno do tema", porque essa frase representa um enigma profundo, que ultrapassa a nossa compreensão racional: (...) uma parte do seu sentido permanecerá sempre intangível e avessa à formulação de uma resposta racional.
23. A CONSTRUÇÃO DO HORIZONTE DE ESPERANÇA: Como recuperar a tradição ética e a idéia de comunidade dentro de uma nova definição de modernidade? Isso porque, a modernidade que está posta, é pura massificação, dominação e opressão. A resposta está centrada na visão crítica do SUJEITO. A presença do SUJEITO no indivíduo, coloca o indivíduo no mundo, ele se abre para ser-com-os-outros, a partir da exterioridade do Outro como sujeito ético, com rosto e com corporeidade, que grita e reclama justiça. As religiões demonstram que da queda do SUJEITO, da consciência do pecado, nasce o apelo à graça e à redenção. O SUJEITO se reconhece e se define por reunir o que está separado. “A religião do futuro é substituída pouco a pouco pela saudade do SER, pelo pesar daquilo[9]” que perdemos. Para o cristianismo, e preciso amar o próximo como criatura de Deus e amar Deus no próximo. Essa máxima cristã pode ser dita na nova modernidade, como o ato de reconhecer o outro como SUJEITO, uma vez que é na relação amorosa ou amigável que o SUJEITO se afirma. E aqui, no aparecimento do SUJEITO torna-se atual o BANQUETE de Platão (em Platão, o amor é uma resposta espiritual, e mesmo que haja a presença da corporeidade, ela não aprisiona o amor. O amor é a inesgotável contemplação do SER). É a relação amorosa que separa os determinismos sociais, nascidos do indivíduo e faz a emersão do SUJEITO ÉTICO. O fundamento da nova ética não está no legalismo (cultura), no naturalismo (na seleção natural), no relativismo, no hedonismo. O fundamento da nova ética está centrado no SUJEITO que descobre o outro, descobre o verdadeiro sentido da alteridade. Incrível!!! Caminhamos por tantas estradas, defendemos tantas teorias ao longo desses três séculos, para por fim, resignados, descobrirmos que a nova ética é a mesma ética defendida pelo cristianismo, desde o início: Reconhecer o outro como SUJEITO, uma vez que é nessa relação amorosa ou amigável que os SUJEITOS se afirmam. Essa afirmação do homem como SUJEITO de sua própria história, demonstra que ninguém realiza ninguém e ninguém se realiza sozinho, só nos realizamos no ENCONTRO.
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[1] TOURAINE, 218.
[2] Id., p. 219.
[3] Referindo-se ao protestantismo histórico americano, Stanley Hauerwas & William Willimon, cit. ap. Tom SINE, Wild Hope, Word Publishing, Dallas, 1991, p. 196; (Cfe. Steuernagel, Valdir R. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana rumo ao ano 2000. Estudos Teológicos. São Leopoldo-RS, 36 (1): 82, 1996). Nesse mesmo sentido, Bobbio afirma que “O filósofo que se obstinar em permanecer só termina por condenar a filosofia à esterilidade.” (1992, p. 24).
[4] HABERMAS, apud Mário Osório Marques. Conhecimento e Modernidade em Reconstrução. Ijuí: UNIJUÍ, 1993, p. 41.
[5] IANNI, Otávio. Teorias da Globalização. Editora Civilização A Brasileira, 1996.
[6] TOURAINE, p. 222.
[7] p. 220.
[8]M. Crubellier. Sens de L'Histoire et Religion, Desclée de Brouwer, 1957, p. 187.
[9] Id. p. 382.


REFERÊNCIAS
ANDERSON Perry et al. Pós-liberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996
BERGER, Peter L. A Revolução capitalista. Belo horizonte: Itatiaia , 1992.
CRUBELLIER, M. Sens de L'Histoire et Religion, Desclée de Brouwer, 1957
JAMESON, Fredric. Pós-modernismo: A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio. São Paulo: Ática, 1997.
____. O Pós-modernismo e a sociedade de consumo. In: KAPLAN, E. Ann. O mal-estar no pós-modernismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
IANNI, Otávio. Teorias da Globalização. Editora Civilização A Brasileira, 1996.
LYOTARD, Jean-François. O Pós-moderno. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986.
MARQUES, Mário Osório. Conhecimento e Modernidade em Reconstrução. Ijuí: UNIJUÍ, 1993
MARCUSE, Herbert. Ideologia da Sociedade Industrial. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1967.
MERQUIOR, José Guilherme. De Praga a Paris. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.
NIETZSCHE, Freidrich Wilhelm. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
SANTAELLA, Lúcia. Pós–Modernismo e Semiótica. CALHUB, Samira (org.). Pós-modernismo & Semiótica, Cultura, Psicanálise, Literatura, Artes Plásticas. Rio de Janeiro: Imago, 1994.
STEUERNAGEL, Valdir R. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana rumo ao ano 2000. Estudos Teológicos. São Leopoldo-RS, 36 (1): 82, 1996
TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. Petrópolis, Vozes, 1994.

domingo, 21 de março de 2010

... Ainda existe o pecado?

 José Luongo da Silveira *

“Não existe pecado do lado de baixo do equador...”
Chico Buarque

“Tudo o que Deus criou é bom e só o que ele criou existe. Portanto, pecado é uma ilusão, ele não existe, pois Deus não o criou”. Shigueoka

Para a tradição ortodoxa, o Mal “não tem substância, mas é a falta do Bem, (...) é desarmonia, ausência de beleza, de vida, de inteligência”. Teólogo Ortodoxo Lambros Siassos.

“Ó feliz culpa! (de Adão e Eva) Que nos trouxe o benefício de um tão grande Salvador!”.
Santo Agostinho.

“Não consigo entender o que faço; não pratico o que quero; pois não pratico o bem que quero, mas faço o que detesto. Não faço o bem que quero, mas pratico o mal que não quero. Ora, se eu faço o que não quero, já não sou eu que estou agindo, e sim o pecado que habita em mim. Constato pois a lei: quando eu quero fazer o bem, é o mal que se me apresenta. Eu me comprazo na lei de segundo o homem interior; mas percebo outra lei em meus membros, que peleja contra a lei de minha razão e que me acorrenta à lei do pecado que existe em meus membros”. Rm. 7, 15-23.

1. O SURGIMENTO DA IDÉIA DE PECADO, DE TABU OU DE INTERDITO


     É possível que inicialmente a idéia tabu e de interdito não tivesse conotação religiosa, surgindo da experiência casual se constituísse na primitiva forma de organização da sociedade, que estabelecia padrões para regular a insipiente vida comunitária. A experiência e o fascínio do sagrado, esse encantamento do mundo, num primeiro momento, poderia ser não-religioso e estar ligado à experiência duma ontofania, onde o sagrado permeia toda a realidade e exprime a significação incondicionada[1].
    O homem percebeu-se, desde cedo, mergulhado numa complicada rede de experiências concretas que vão das motivações biológicas às influências do grupo social, envolvendo a apreensão de imagens, de circunstâncias e fatos que povoam seu cotidiano. Como ser biológico, o homem vive e sente, mas
    Não possui ele a inocência do animal, que pode abandonar-se à sensibilidade e ao instinto para orientar-se na vida; mas primeiro, deve conhecer bem o que ele é, e logo, conhecer o mundo e a realidade de que faz parte, e depois viver, orientar-se livremente, de conformidade com este conhecimento profundo[2].
    A partir dessa ótica, a realidade toda se apresenta como um campo aberto, com diferentes graus de comunicação, mas passível de ser investigada e interpretada. O homem emerge da inteligência concreta, atrelada só às experiências vividas, e penetra no mundo das idéias abstratas, graças à representação simbólica do mundo da linguagem[3], somente nesse ponto é que emerge a idéia de pecado, de transgressão e culpa. Diante do sagrado se estabelece uma estrutura de dialogicidade e de conflitualidade. É evidente a ambivalência do sagrado que se apresenta benéfico e maléfico e onde o sacrifício apazigua e aplaca a ira dos deuses, por causa do pecado dos homens.
      Reconhecemos que se torna difícil qualquer incursão no tempo para reconstituir o passado do homem, o seu modo de vida primitivo, as suas relações com a natureza e a irrupção do divino na trama do mundo. As fontes disponíveis são meros relatos míticos, inscrições e objetos que, de algum modo, refazem o cotidiano do homem durante a fase que vai do eolítico à revolução neolítica. Um recurso disponível de grande alcance, a serviço da sócio-antropologia, é o exame do estilo de vida das comunidades primitivas de hoje, as quais levantam a ponta do iceberg sobre o paulatino desenvolvimento da inteligência, os hábitos de vida e os regramentos sociais.
      A primeira fase de interpretação do mundo caracterizou-se pela alternância entre o desejo e o medo, entre a realidade pré-reflexiva das emoções e a angústia do desconhecido, entre o mundo visível, “concebido como repetição de um ato mítico[4]”, e o mundo invisível e imaginário. Entretanto, o ato de modelar a realidade, muito embora de modo fragmentário, já começou na pré-história. O mundo não-reflexivo não é de indiferença em face aos fenômenos naturais. Desde cedo a ação humana se faz sentir através de uma interpretação da realidade, a partir do desejo de dominar os fatos e acontecimentos a que estava sujeita. Essa fase não-crítica constrói um conjunto de verdades intuídas capaz de dar suporte às indagações sobre o mundo. O toque do sagrado perpassa todas as coisas, revelando dramaticamente uma gnose intuída, para tentar compreender o enigma da vida e do universo. Nessa fase, os rituais mágicos desempenham o papel de aplacar a ira dos deuses e fortalecer a confiança do homem em si mesmo. A perspectiva do sagrado parte do pressuposto de que o inexplicável depende de ações mágicas, para se tornar propício aos desejos e interesses da tribo ou do grupo. O sacrifício de uma vítima tem o poder para instaurar e restaurar a ligação entre o povo e a divindade.
     A manifestação da consciência coletiva, marcada pelo medo, gera inicialmente o culto às misteriosas forças da natureza e, mais tarde, às divindades funcionais que regulavam os diferentes ciclos da natureza. Permanece atrelada ao coletivo a consciência do eu, de tal modo que a adesão, sem críticas, às tradições do grupo comunitário, modela toda a realidade percebida, onde o pecado individual tem as conotações de coletivo.
     O indivíduo se move dentro de um mundo dinâmico, onde as funções e atividades exercidas pelos diferentes segmentos têm a aceitação dos demais membros da comunidade. É indiscutível que os mais espertos manipulavam a realidade, sob o manto do fantasioso sagrado livremente aceito, para incutir o medo e a insegurança do desconhecido nos demais componentes do grupo. Mesmo porque as regras de conduta social eram ditadas pelos chefes que acreditavam/afirmavam sua procedência divina. É perfeitamente crível que, num primeiro momento, tenha sido esse o entendimento; porém, com o tempo e o desenvolvimento nas relações tribais, aproveitadores manipulavam a estrutura social de acordo com a sua vontade, para obter prestígio ou a preservação de sua autoridade total sobre o grupo liderado.
    Juntamente com os sacrifícios de animais e humanos[5], para a expiação dos pecados do povo, os banimentos do grupo tribal constituíam as mais elaboradas formas de dominação e opressão das sociedades primitivas. As freqüentes exclusões sociais, como forma de banimento na sociedade primitiva, faziam com que o excluído, muito embora continuasse presente, tivesse a sua presença física ignorada e, portanto, acabasse desassistido pela comunidade.
     Desde o início, está presente o critério de domínio do grupo sobre o indivíduo. À adesão irrestrita ao grupo tribal corresponde a única forma de sobrevivência possível. Toda a consciência mítica é perpassada pela experiência comunitária, onde o indivíduo existe em função do grupo a que pertence. A consciência de si mesmo como indivíduo é relativizada pela preponderância do coletivo[6]. Na verdade, é a aceitação tácita do coletivismo sem nenhum traço de individualidade. A consciência mítica funciona como um processo que foi se sedimentando aos poucos, de modo comunitário, ‘vivo’ e rico em significação e que surgiu espontaneamente no meio do povo, como uma resposta intuída, embora seja possível que a então dominante casta sacerdotal tenha sido responsável por sua manutenção e interpretação[7].
    Encontra-se, como elemento comum nas diferentes culturas pré-históricas, a fase das divindades funcionais, encarregadas dos diferentes ciclos da vida. É possível que também tenha aparecido uma elaborada casta sacerdotal para a prática de rituais mágicos, a fim de aplacar a ira dos deuses. Aproveitando-se dessa estrutura, pode ter surgido a mais terrível forma de dominação, com a prática reiterada de sacrifícios humanos, sob o pretexto de proteger as colheitas e as vidas da ira das deidades[8]. O critério expiatório das transgressões do povo centrava-se nos ritos sacrificais, “o sacrifício da culpa ou da reparação” e, muitas vezes, exigia imolações humanas. A idéia fundamental dos holocaustos e a significação do derramamento de sangue era o centro da noção de sacrifício que não dependia do querer humano, mas exclusivamente da vontade dos deuses, revelada à casta sacerdotal.
    Já entre os hebreus, no culto oficial, era comum o sacrifício de animais, quando a carne da vítima ou só as gorduras eram consumidas sobre o altar em honra de Javé. Havia também a refeição sacrifical, em que o povo consumia a carne do sacrifício - o ato de “comer e beber na presença de Javé[9]”. O centro da idéia de sacrifício do povo hebreu era uma tentativa de obter a bênção sobre os rebanhos e frutos. Essas oferendas santificavam os rebanhos e os frutos da terra. Havia também entre os israelitas a idéia de sacrifícios expiatórios pelos pecados do povo[10] e até mesmo a compreensão de que Javé se alimentava das oferendas[11]. Na América, na Ásia e em outros continentes, há inúmeros vestígios de sacrifícios humanos; a própria Bíblia relata o sacrifício de crianças, considerando-o como uma profanação[12], realizada por povos vizinhos[13].
    A questão é saber se, do período Paleolítico Inferior ao Neolítico, essas práticas ritualísticas emergiram só da convicção religiosa, nascidas do imaginário coletivo, ou se constituíram-se, aos poucos, num instrumento de dominação e controle sobre o grupo social. Parece óbvio que, desde a primeira forma de organização social, os detentores do poder criaram instrumentos para a regulação de seus interesses e privilégios pessoais, camuflados por uma cosmovisão religiosa, que carregava a idéia de pecado e de culpa, essa última advém da violação do costume. Examinando-se as sociedades pré-históricas, percebe-se quão antigo é o processo de dominação. São milhares e milhares de anos de opressão.
    Para o homem primitivo, mergulhado numa estrutura mágica, onde “o mito é a primeira fala sobre o mundo[14]”, a realidade é essencialmente dogmática. Aliás, ainda hoje, quanto mais atrasada é uma comunidade ou instituição, mais presa a conceitos fixos e rijos se encontra. Nesses contextos, as regras de conduta coletiva se tornam, aparentemente, tão evidentes que não se admite contestação, criando o que se convencionou chamar de “tabu”.
     A passagem da realidade pré-lógica para a racionalidade reflexiva teria sido o resultado de um longo despertar, onde a interpretação mítica vai cedendo lugar à percepção da individualidade[15]. O “eu” vai desaparecendo como personagem[16] mergulhado no grupo social e toma consciência de sua individualidade. Contudo, essa ruptura total entre “mythos”, o componente mágico da realidade, e “logos” nunca aconteceu.
     Era de se esperar que os avanços científicos e tecnológicos decretassem a morte do mito, como uma forma de saber ingênuo situado na distante pré-história. Houve, inclusive, alguns pregoeiros, como Augusto Comte, que decretaram a morte do mito (...). Para o moderno racionalismo parece haver inteira oposição entre o mito e a coisificação do pensamento científico. Entretanto, por mais absurdo que pareça, a moderna ciência fez renascer o mito, tornou o mito possível à medida em que se arvora na única resposta para a realidade - criando o mito da cientificidade... da certeza racional, do progresso, da liberdade, da democracia, da justiça, da paz, da segurança, do bem comum...[17].


2. PECADO DE MAIS E PECADO DE MENOS

     Para os Judeus toda enfermidade tinha origem moral e era causada pelo pecado pessoal ou dos pais[18]. Vivia-se sob a égide do pecado. Jesus cura o paralítico dizendo: “Perdoados te são os teus pecados[19]”. No tempo de Jesus a noção de pecado era distorcida e no mundo de hoje é banalizada. Parece que o homem opta por viver os extremos: “tudo é pecado” e “nada é pecado”. A idéia de que “tudo é pecado” carrega consigo um acidente no programa que Deus estabeleceu na Criação e que o homem não cumpriu. Em razão desta culpa, o homem durante toda a sua existência, vive uma dualidade, como diz São Paulo: quer o bem, mas faz o mal que não quer. Trata-se de um paradoxo racionalmente insustentável: em um mundo não linear é exigido do homem uma linealidade absoluta.
    Parece que o mundo ocidental ainda está impregnado do dualismo maniqueísta: tudo o que o que no homem não é bom, é mau. Só existem o mal e o bem. Tal assertiva padece de uma veracidade já na sua origem, porque existem realidades que não são nem boas e nem más, não estão subordinadas ao crivo do certo e do errado. É impossível dizer quão longe o homem pode levar as suas próprias convicções sobre o bem e o mal. No testemunho da história, muitos mataram e morreram pelo que acreditavam serem verdades[20]. Com essa radicalização, o homem torna-se escravo do seu próprio discurso e dele se convence, tão sinceramente, que é capaz de dedicar uma vida inteira à consecução de suas idéias. A compreensão maniqueísta de dividir as coisas entre verdadeiro/falso ainda faz parte do cotidiano das pessoas, cria motivações, projetos de vida e uma decodificação de toda a realidade percebida. São juízos de valores que estão presentes nas mais diferentes manifestações da existência humana. Dessa forma, o homem está preso no labirinto de suas estruturas conceituais e nessa construção ideológica[21] investe a sua própria felicidade. Todo o processo de criação de estruturas conceituais que refletem a realidade dos valores e interesses, como a finalidade da existência, a presença do pecado e do mal etc.
   E aqui está o grande paradoxo da existência, o intransponível labirinto das estruturas conceituais. O homem não tem saída, está literalmente preso nessa prisão sígnica entre o bem e o mal, entre o pecado e a graça. O sentido mais remoto da idéia de bem está associado à idéia de felicidade, como destino da humanidade; por conseqüência, há o desejo de tender a esse bem como dever manifesto pela consciência. A natureza do bem é um poder que constrange, é uma necessidade racional que se manifesta na conduta moral e legal.
    No des/modelar para modelar de novo, mesmo que o homem migre para um novo paradigma, libertar-se-á de uma estrutura-modelo para se tornar cativo de outra. Não há saída, não há forma de romper com o passado sem se abrigar em outras servidões. As nossas idéias nos definem, nos transformam e a luta pelo novo, pela mudança, é continuidade enquanto somos capturados em novos vínculos. Contudo, se é impossível a existência humana sem esse suporte, tal não pode ser absolutizado com a promoção da cultura da intolerância, a ponto de se tornar difícil a convivência com outras percepções da realidade. Na sociedade pós-moderna, a cultura da intolerância está assumindo proporções perigosas; o divergente/diferente não só não é aceito, como se cria uma série de obstáculos à sua existência no convívio social[22]. O caminho da diversidade na unidade, do pluralismo, da inclusividade, parece ser a única resposta aceitável. Saber conviver com pontos de vista discordantes - o embate das idéias - aprofunda ou derriba as nossas certezas parciais, provisórias e precárias[23]; isso só é possível quando não nos submetemos ao germe da radicalização.
    Aqui cabe uma reflexão maior sobre o problema do pecado e do mal, sob o qual tem se debruçado a filosofia e a teologia durante todo o tempo. A pergunta que tem perpassado o pensamento filosófico e teológico é: se Deus é a infinitamente bondade e onipotência, por que existe o mal, o pecado e o sofrimento? Se permite, onde está a sua bondade e se nada pode fazer, no que consiste a sua onipotência? Esse tem sido o argumento central na negação da existência de Deus. É claro, que esse dualismo grego foi suplantado pela concepção do livre arbítrio. Numa visão teológica, percebe-se que o livre arbítrio existe também nas esferas angelicais, a partir do qual se pode defender a idéia de que o mal é o mecanismo para a afirmação do bem, da mesma forma de que se não houvesse a liberdade de escolha não haveria a meritoriedade das ações humanas. Parece que toda a ação humana só pode ser motivada pelo bem. É um bem que leva o sujeito a agir, mesmo que realize o mal por fraqueza de vontade ou por ignorância. Essa é a tese de Descartes: “omnis peccans est ignorans”. Temos uma vontade orientada para o bem, mas sucumbimos ao mal e ao pecado
    A solução do problema do mal e do pecado parece atingir a excelência especulativa em Agostinho, quando afirma que o mal não existe, ele é fundamentalmente a ausência do bem e resolve-se mediante a redenção, em Cristo. Para Agostinho, a vontade humana pode ser má, contudo, não é causa eficiente, mas deficiente, visto que o mal não tem realidade metafísica, já que Deus fez boas todas as coisas. Como com o mal o homem não pode lesar a Deus, prejudica-se a si mesmo.

3. O PECADO E A CULPA NA TRADIÇÃO JUDAICO-CRISTÃ


     A base da civilização ocidental encontra-se engastada nas concepções greco-romanas que absorveram a cultura religiosa judaico cristã. Nesse particular, se insere o problema da culpa. Somos uma civilização dominada pela idéia do pecado e da culpa. O pecado acarreta a noção de culpa e a culpa nos persegue desde crianças, como um fantasma imaginário, que não tem existência real, contudo, continua a assombrar o nosso cotidiano. Quanto ao pecado não há diferença entre os homens: “…todos estão sob o domínio do pecado. Assim está escrito: Não há justo algum, nem um sequer[24]” e ainda, “Do coração dos homens saem os maus pensamentos, as prostituições, roubos, assassínios…[25]”. A cultura ocidental dominada pela culpa, pelo pecado e pelo medo fez com que Freud se referisse à religião como uma forma de neurose coletiva, onde se aterroriza com o sofrimento eterno, em detrimento do amor, do perdão e da misericórdia de Deus. O cristianismo, principalmente a partir período medieval, passa a ser uma religião causadora de culpa, quando considera de que a nossa natureza é mais voltada para o mal do que para o bem. A idéia de que somos maus por natureza, o sentimento de culpa de nossa maldade, abandono e danação, desenvolve a neurose obsessiva no ser humano, quando a religião deveria priorizar o perdão e a misericórdia de Deus: “... não fiquem aflitos, nem tenham medo[26]”. Segundo a Carta da Comunidade de Taizé[27], o pecado conduz ao remorso, cuja saída pode ser o desespero ou o arrependimento. O documento de Taizé conclui que talvez não haja arrependimento sem remorso.
    O conceito judaico de pecado foi sendo adaptado através dos tempos. Inicialmente significava a violação do interdito, do tabu, que deveria ser reparado pelos sacrifícios expiatórios. Posteriormente, a idéia de pecado foi se ampliando, passando a distinguir os pecados contra Deus, que podem ser expiados pelo regresso a Deus, retorno (“Teshuvá”, em hebraico) e os pecados contra a humanidade que podem ser reparados pelo perdão daquele que foi agravado.
    Além do mais, a concepção de pecado no judaísmo, assim como nas demais religiões monoteístas, carrega consigo um outro pecado, a idéia da supremacia masculina. Deus, sacerdotes e profetas apresentam valores patriarcais. O mito da criação em Gênesis diz que: “E da costela que o Senhor Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe-a a Adão[28]”. Mais, a mulher, por ser inferior, provocou a queda da raça humana[29]. Nesse período, o sagrado feminino foi demonizado, declarado impuro, só reabilitado, mais tarde, no cristianismo, através da figura da Virgem Maria. O mito criador ignorou uma verdade biológica que a ciência agora conhece, com certeza, de que todo o feto humano é feminino nos primeiros dias de vida. A ciência já sabe que primeiro nasceu a mulher, pois, a característica masculina, o “y” vai aparecer mais tarde, no período de gestação.
    Nesse contexto, torna-se interessante a visão platônico-agostiniana, no qual o mal que existe no homem não tem existência real (é causa deficiente e não causa eficiente). Isto significa que o mal encontrado na natureza humana não possui substância ou estrutura ontológica, é tão somente a negação do bem ou o não-ser, deste modo, toda essa desordem não tem realidade metafísica. Aspira o existente humano ao perfeito, ao sublime, entretanto, aprisiona-se em desvalores.
     O homem conhece a realidade dos valores a partir de sua dimensão antropológica, em relação ao seu próprio ser e em relação ao modelo ideal, não há outro caminho. Agostinho de Hipona reconhece que o ser é bom, porque despojado de sua bondade deixaria de existir, neste caso, “seja o que for, que tenha qualquer grau de existência, é bom[30]”. “Dessa forma, nem a mesma natureza do próprio diabo é má, à medida em que ele é natureza; no entanto, ela se tornou má ao ser pervertida[31]”. Toda a construção do pensamento parte dos prolegômenos fenomenológicos, das propriedades do homem, passando depois à natureza metafísica e espiritual, como auto-transcendência ou realidade última do ser. A partir desses pressupostos, o homem lê o mundo. A axiologia antropológica, assume feições de teologia ao situar-se no campo do monoteísmo radical, ou seja, ao admitir plenamente que Deus age no mundo através de leis tendentes à realização última do homem e do universo, através do homem, com o homem e apesar do homem.
    Para Agostinho de Hipona o mal existente na criação é a ausência de Deus depois da queda original. E, a teologia da graça concilia a causalidade absoluta de Deus com a liberdade humana [32]. Segundo o mestre de Hipona: “a primeira liberdade consiste em estar isento de crimes ... como seja o homicídio, o adultério, a fornicação, o furto, a fraude, o sacrilégio e assim por diante. Quando alguém principia a não ter estes crimes, (...) começa a levantar a cabeça para a liberdade, mas isto é apenas o início da liberdade, não a liberdade perfeita[33]”. O Verbo[34] é o centro da história humana e na compreensão dos dois amores que fundaram as duas cidades, encontra-se implicitamente as noções básicas do mundo das idéias e do mundo das formas, defendido por Platão[35]. “Dois amores contruíram duas cidades: o amor de si levado até o desprezo de Deus edificou a cidade terrestre; o amor de Deus levado até o desprezo de si próprio ergueu a cidade celeste; uma rende glória a si, a outra ao Senhor; uma busca uma glória vinda dos homens; para a outra, Deus, testemunha da consciência, é a maior glória[36]”. Os vinte e dois livros, denominados “A Cidade de Deus[37]”, escritos entre os anos 413 e 426, onde Agostinho de Hipona descreve o Reino de Deus e o Reino do Mundo, não estabelecem qualquer identificação da “Cidade de Deus” com a Igreja ou da “Cidade do Mundo” com o Estado. Agostinho de Hipona sabia perfeitamente que a Igreja não é o Reino de Deus, mas um sinal deste Reino; enquanto o Estado ao apoiar o bem, também se torna um sinal de esperança do Reino. A cidade terrena, com seus antigos ritos e sacrifícios, constituída pelas pessoas más e ímpias[38] é uma cópia imperfeita da realidade e toda a sua existência não passa de sombras e trevas se comparada com a cidade celeste. Na Cidade Celeste, Cristo é o criador da história, antes de sua vinda a história caminha para ele e, após a sua chegada, tudo reflete a sua presença, como centro para o qual convergem todas as coisas[39]. Essa Cidade Celeste não se torna perfeita realidade aqui na terra, mas dentro de um horizonte escatológico[40] . Por enquanto, “as duas cidades - civitas Dei e civitas terrena ‘permanecem confusamente unidas’ e só quando a razão é ‘purgada e instruída pela fé’, é que se pode descobrir e entender o propósito da história, o ‘fim da nossa jornada’ e ‘o nosso caminho para ela’[41]. O mundo sensível é apresentado como cópia, um molde imperfeito do mundo das idéias. Tem-se, assim, uma reedição das alegorias[42] de Platão: a alegoria dos dois cavalos alados e a alegoria da caverna. Na cidade celeste, está presente uma grande recapitulação da "lex creationis et lex revelationis", de importância metafísica para o cristianismo, pois nela toda a história converge para o Verbo e ele se torna o centro gravitacional de um fenômeno escatológico, realizando o passado, antecipando o futuro e glorificando o presente messiânico. Essa parte é o momento de peroração do pensamento agostiniano, apresentando uma teoria jurídica dentro de um plano pleno de historicidade no contexto da revelação. É como se alguém espreitasse no horizonte da história e pudesse, ao mesmo tempo, perceber o passado e antever o futuro, descobrindo o alfa e o ômega da história, numa visão unitária. Na lei divina, apreendida pela iluminação, presentes acham-se, também, os conceitos eternos e imutáveis da alma humana, sendo a lei natural uma emanação dessa realidade; já a cidade terrena, satânica por natureza[43] , por afastar-se da lei eterna, despreza as coisas do alto e está condenada à punição eterna. Na separação entre as duas cidades, ainda que não sejam antitéticas, há uma certa semelhança com a filosofia platônica. Enquanto Platão admite a conciliação dos opostos, sair do mundo das trevas e chegar ao mundo luminoso das almas por meio do conhecimento; Agostinho, fiel à mais antiga tradição bíblica, fala na danação eterna e na redenção através do Verbo.
    Examinando-se o pensamento platônico-agostiniano, em que ambos falam de uma danação eterna, socorre ao autor a argumentação de que, para haver o triunfo final do bem sobre o mal, há necessidade de que o mal desapareça e o Verbo, “cheio de graça e de verdade[44]”, arrebate a si todas as coisas, como rei e senhor do universo. Sabe-se, de antemão, que a teologia bíblica não conduz a esse raciocínio, entretanto, se o mal continuar, como ausência do bem além da parusia[45], reafirma-se, de algum modo, o eterno dualismo maniqueísta[46]. Porém, o exame desta problemática se procede a título de argumentação teórica, sem contraditar a ortodoxia da doutrina e fé Cristã. Em Agostinho há um fascínio pelo exame da realidade, dividindo sempre o mundo entre dois opostos, o bem e o mal. Tillich afirma que “Agostinho combateu por um caminho que mediasse entre o maniqueísmo e o pelagianismo[47]”. Neste aspecto, o que parece diferenciar o pensamento agostiniano do maniqueísmo é a compreensão do mal como ausência do bem, sem o eterno dualismo maniqueísta e, mais precisamente, o anti-dualismo agostiniano se manifesta na defesa do ser como bom. Todo o ser é bom, pelo simples fato de existir, está incluído no amor divino.
    A lei eterna é a suprema ordenação de todas as coisas: a lei eterna é a harmonia que existe no Criador, manifesta na criação como lei natural, ou nas próprias palavras de Agostinho de Hipona é “a razão ou a vontade de Deus que manda observar a ordem natural e proíbe alterá-la” [48]. Essa ordem divina se transmite aos seres inanimados como força cega, nos animados como necessidade do instinto. E, no homem, como ordem moral que se manifesta na "obediência à verdade"[49]. É impossível aos seres inanimados e aos animais desobedecerem a esse ditame natural, entretanto, ao homem por ser dotado do livre arbítrio, da liberdade de escolha, tal desobediência é possível. E face à queda original, o homem e toda a natureza, como diz São Paulo, encontram-se como que num processo de parto até que tudo se consuma no todo[50]. Assim, na visão platônico-agostiniana, o mal que existe no homem é causa deficiente e não causa eficiente. Isto significa que o mal encontrado na natureza humana não possui substância ou estrutura ontológica, é tão somente a negação do bem ou o não-ser, deste modo, toda essa desordem não tem realidade metafísica. Aspira o existente humano ao perfeito, ao sublime, entretanto, aprisiona-se em desvalores.
     Por conseguinte, poder-se-á afirmar que o pecado e a injustiça consistem, essencialmente, no afastamento do homem do fundamento axiológico do ser, como já o era para Kierkegaard (1.813-1.855)[51], trata-se da falta de relação existencial entre o indivíduo e seu objeto ou a ausência de uma síntese entre eternidade e tempo, quando o homem se afasta do estágio religioso ou absoluto[52]. Consiste no distanciamento do valor-bem superior, o que coincide com a idéia de pecado.

4. CONCLUSÃO


     No estudo do documento do Concílio Vaticano II, Gáudium et Spes[53], percebe-se que a própria Igreja Católica abandonou a idéia de que o homem é um pecador condenado à danação eterna, para admitir de que o homem possui uma dignidade sem igual, um valor intrínseco, em nome da qual o Concílio defendeu uma liberdade religiosa do tipo protestante, fundada na liberdade de consciência, quer dizer, na opinião individual em matéria de fé e não no princípio católico de autoridade[54]. A Gaudium et Spes afirma categoricamente que Cristo “restaurou na descendência de Adão a semelhança divina, alterada desde o primeiro pecado (a primo peccato deformatam)”. Assim, a idéia legalista de culpa perdeu o seu lugar na teologia católica, não se enaltece mais a cruz como resgate de culpa, mas como o símbolo da Ressurreição, da vitória da vida sobre a morte.
    Assim, o homem como um ser em busca da graça, em busca de plenitude:
4.1 - A dinâmica da vida: a dinâmica da vida caracteriza o homem como um ser em busca de plenitude. Um ser inacabado e insatisfeito que caminha para além do que é e do que tem. Todo o questionamento filosófico e científico resume-se na busca das respostas fundamentais para a existência do homem e das coisas. A dinâmica da vida humana na concepção platônica, dá-se através do conhecimento intelectual, como reminiscência do mundo das essências, esse conhecimento é universal, imutável e absoluto. Em "Fédon"[55], Platão afirma que os filósofos serão libertados da matéria para sempre. A dinâmica da vida para o Absoluto, em Agostinho de Hipona, encontra-se também resolvida pelo iluminismo platônico, porém o conhecimento intelectual é dependente da luz espiritual do Verbo, centro da história humana. A dinâmica da vida para o Absoluto, na visão de Paul Tillich, carateriza-se na correlação "eu-mundo" e essa situação de desespero, de degredo causada pelo pecado, sem respostas para o paradoxo da existência, predispõe o homem a escutar a Palavra revelada[56]. O que leva o homem a sair do convencional, da faticidade e caminhar em direção ao mundo metafísico e teológico, para encontrar respostas para a vida, são as suas terríveis limitações, o medo do pecado, do aniquilamento total e, ao mesmo tempo, o desejo incontrolável de romper a casca dos estreitos limites, onde se desenrola o drama humano. Numa palavra, a "episteme" é fruto da contínua busca de perfeição, descrita por Platão[57].
4.2 - A necessidade de romper os condicionamentos estabelecidos pela facticidade: na dinâmica da vida são importantes três aspectos que expressam a esperança do homem em romper certos condicionamentos acarretados pelo pecado e pela culpa:
* marco situacional: compreende a realidade em que se está inserido. Uma sociedade pluralista, competitiva e imediatista, onde predominam as características de influência e de poder, locuplemento e promoção pessoal, de pecado estrutural, embora que em alguns casos haja fins altruísticos, fica-se no terreno da imanência;

* marco referencial: interagindo sobre o marco situacional e os contextos comunitários marcados pelo egoísmo, desponta um caminho, uma utopia possível que liberta o homem dos condicionamentos confinantes. Tem-se como muito difícil o abandono do pecado do egoísmo, algo que se introjetou desde tempos imemoráveis ou, especificamente, desde a queda original. Contudo, vários homens e algumas comunidades ao longo da história [58] conseguiram viver a magia espontânea do amor que liberta e transforma, através do advento da comunidade físico-espiritual, onde os homens são partícipes de um processo de profunda interação. Esta "civilização do amor" não é o amor como um fim em si mesmo, levando as pessoas para a esfera de influência e poder pessoal, mas a superação do egoísmo, algo novo que vem de cima e impele o homem a caminhar em direção ao outro. No pensamento agostiniano a comunidade físico-espiritual é solidariedade, participação e serviço, como koinonia vertical e horizontal;

* marco operacional: como “modus agendi” do marco referencial, dentro de uma perspectiva de coerência, é importante que as distinções temporal-espiritual, sagrado-profano e natural-sobrenatural sejam superadas. Esse dualismo que caracteriza a vida espiritual e a realidade concreta, como distintas e irreconciliáveis, não pode subsistir. Caso contrário, a primeira será sempre um enxerto artificial que se tenta inserir na realidade da vida. A vida espiritual não é distinta do cotidiano, não é um não-mundo ou um antimundo. Apesar do dualismo ontológico, não existe o mundo inteiramente desdivinizado e o mundo sacralizado. Na concepção do platonismo agostiniano, o mundo de aparências descobre aqui a "anamnesis"[59], despertando a reminiscência do mundo verdadeiro que ainda habita as profundezas da alma humana, ou a Cidade de Deus também se realiza parcialmente neste mundo, aliás, aqui é o grande palco de manifestações da Cidade Terrena e da Cidade Celeste[60]. O pecado não tem existência real, ele é a ausência da graça e todos os homens, redimidos por Cristo, gozam da mesma vocação divina.
      Sempre cabe enaltecer os insondáveis desígnios de Deus, “onde abundou o pecado, superabundou a graça de Cristo[61]”. Por isso, dizemos com Agostinho: “Ó feliz culpa! (de Adão e Eva) Que nos trouxe o benefício de um tão grande Salvador!”.
    Ainda existe o pecado? Sim, o pecado existe, ele é, em última análise, um ato de desamor. Só o amor é a eterna inocência, ninguém sabe quando vai amar, porque ama e o que é o amor. “Os que se abandonam no amor, esses não pensam na generosidade de seu gesto, no pecado ou na virtude, nem na promessa de recompensa. Dão o seu amor, simplesmente, para continuar a viver”. ESTAMOS NA VIDA PARA APRENDER A AMAR!
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* Clérigo da Diocese Sul-Ocidental, IEAB, Comunhão Anglicana e professor universitário.


[1] TILLICH, Paul. Philosophie de la religion. Labor et Fides, 1971.
[2] PADOVANI, Humberto. História da filosofia. São Paulo: Melhoramentos, 1967, p. 55.
[3]Aranha, explicitando essa realidade, afirma: “Eis aí a diferença fundamental entre o homem e os animais. Mas, para produzir cultura, o homem precisa da ‘linguagem simbólica’. Os símbolos são invenções humanas por meio das quais o homem pode lidar abstratamente com o mundo que o cerca... Além disso, com a linguagem simbólica o homem não está apenas presente no mundo, mas é capaz de reproduzi-lo: isto é, o homem torna presente aquilo que está ausente.” (ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e Maria Helena Pires Martins. Temas de Filosofia. São Paulo: Moderna Ltda., 1992, p. 29).
[4] MAGALHÃES, Rui. Textos de Hermenêutica. Porto: Rés-Editora Ltda, 1984, p. 7.
[5] A idéia de culto sacrifical, como oferenda de expiação, está presente nas antigas tradições de muitos povos. Vide I Sm. 6,3.
[6] Gusdorf apud ARANHA, Maria Lúcia de Arruda, in Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo: Moderna, 1991, p. 28, e 102.
[7] SILVEIRA, José de Deus Luongo da. As várias faces do direito. Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2001, p. 19.
[8] Já no período neolítico, começa a construção de habitações, a prática da fiação, da cerâmica, as divisões sociais, a estrutura de normas consuetudinárias gerais, o esboço da organização estatal e o controle político exercido por um chefe que congrega todos os membros da clã (CARBALLERO, Alexandre. O ser em si e o ser para si. RBF, v. 46, 1968, p. 12-13).
[9] Ex. 32,6; Dt. 12,18; Jz 9,27; Sf. 1,7; Ex. 34,15; Ism. 9,12ss; II Rs. 10,19.
[10] Ez. 44,24ss; 40,39; 45,21ss; Mq. 6,7; II Rs. 12,17, etc.
[11] Lv. 21, 6,8, 17; 22,25; I Sm. 21, 7; Ex. 25,30, etc.
[12] O rei Acaz queima em sacrifício o seu próprio filho a um deus pagão. Vide 2 Rs. 16, 3
[13] Lv. 20,1-5
[14] ARANHA, Maria Lúcia de Arruda e Maria Helena Pires Martins. Temas de Filosofia. São Paulo: Moderna, 1992, p. 63.
[15] VERNANT, Jean-Pierre. As Origens do Pensamento Grego. São Paulo: Difel, 1977, 297.
[16] GUSDORF, Georges. Mito e Metafísica. São Paulo: Convívio, 1979, p. 102.
[17] SILVEIRA, José Luongo da. Noções preliminares de filosofia do direito. Porto Alegre: Fabris, 1998, p. 25.
[18] Sl. 38 e 41.
[19] Mt. 9, 1-8.
[20] Nietzsche, no entanto, rompe com a idéia de se imolar pela verdade, afirmando: “Morrer pela verdade. - Não nos deixaríamos queimar por nossas opiniões: não estamos tão seguros delas. Mas, talvez, por podermos ter nossas opiniões e podermos mudá-las.” (apud Candido. A Crise dos Paradigmas Modernos. 1995, p. 1 (http://www.hotnet.net/~candido/paradigmas.html).
[21]Gouldner descreve a ideologia como “o reino da exaltação do espírito, onde habitam o doutrinário, o dogmático, o apaixonado, o desumanizante, o falso, o irracional e, é claro, a consciência extremista.” In: The Dialectic of Ideology and Technology, London, 1976, p. 4 (apud EAGLETON, Terry. Ideologia. São Paulo: UNESP., 1997, p. 18).
[22] Marcos Rolim: “Vivemos uma cultura de intolerância, de não aceitação das diferenças. Basta olhar os prédios e as ruas que não foram planejadas considerando os portadores de deficiência física. Os programas infantis são apresentados por loiros, os surdos não têm reconhecida sua linguagem, os homossexuais são ridicularizados, os soropositivos perdem empregos e os doentes mentais são condenados à incapacidade e periculosidade.” (In: A Assembléia combate ‘cultura da intolerância’, Correio do Povo, Empresa Jornalística Caldas Júnior, Porto Alegre, 14.08.1999, p. 7).
[23] As verdades absolutas podem ser admitidas num plano metafísico e espiritual. No mundo fenomenológico não há verdades absolutas, caso contrário como poderíamos explicar os avanços da ciência (Vide KUHN, Thomas. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo:Perspectiva, 1975).
[24] Rm. 3, 9-10.
[25] Mc. 7, 21.
[26] Jô. 14, 27.
[27] Carta de Taizé, 2003/5. Disponível em:
< http://www.taize.fr/pt/index.htm?page=/pt/ptsr503.htm>. Acesso em 30 de jul. 2004.
[28] Gn. 2, 22.
[29] Id. 3, 6.
[30]AGOSTUNHO. Confissões. Paris: Opera onmia, 1938, p. 46.
[31]Id. De Civitate Dei, XIX, 13. Paris: Opera Onmia, 1838.
[32]Humberto Padovani. História da Filosofia. São Paulo, ed.Melhoramentos, 1967, p.115, 117, 210, 211.
[33]Agostinho de Hipona. in Iohannis Evangelium Tractatus, 41,10: CCL 36, 363.
[34]Chistós: adjetivo verbal grego para traduzir do hebraico a expressão "Meshiah", que significa "o Unigido do Senhor".
[35] AGOSTINHO. De civitate Dei, XIV, 28. Paaris: Opera onmia, 1838.
[36] Id. De Civitate Dei.
[37]Reino de Deus: expressão aramaica (Malkuth), que aparece 40 vezes em Lucas, 7 vezes em Atos dos Apóstolos e 8 vezes nas cartas paulinas, significando a glorificação final, quando terminar este tempo, com o advento da plena comunidade pascal.
[38] AGOSTINHO. De civitate Dei, X, 4-6. Paris: Opera onmia, 1838.
[39] Id. Livros XV, XVI, XVII e XVIII.
[40]Scatón: palavra grega que significa mundo novo, mundo vindouro, além do tempo. E também pode designar o momento entre o "já" e o "ainda não", entre uma visão escatológica presente e a visão escatológica futura.
[41]Agostinho de Hipona. De Civitate Dei. Liv. XI, caps. 1 e 2; cit. por Alan Richardson, in Apologética Cristã. Rio de Janeiro: casa Publicadora Batista.
[42]Alegoria: conjunto narrativo ou descritivo, de caráter natural, histórico, filosófico ou religioso, onde os elementos simbólicos correspondem aos elementos significados.
[43] AGOSTINHO. De civitate Dei, Livro X. Paris: Opera onmia, 1938.
[44]Jo. 1, 14.
[45]Parousía: parusia, palavra grega que significa estar próximo, ter chegado, estar presente, presença, vinda, volta gloriosa de Cristo no fim dos tempos.
[46]Maniqueismo: seita filosófico-cristã fundada por Manes, no século III, que afirmava a existência de dois princípios eternos e irreconciliáveis, o bem e o mal, iguais e fundamentais.
[47]Paul Tillich. Teologia Sistemática. São Paulo. ed. Sinodal/Paulinas, 1967, p. 274.
[48]Agostinho de Hipona. Contra Faustum, Liv. 22: Pl 42, 418.
[49]1 Pd. 1,22.
[50]Rm. 8, 22.
[51]Sören Kierkegaard. Ou Um ou Outro e Estágios do Caminho da Vida.
[52]ibidem.
[53] Documento do Concílio Vaticano II. Gaudium et Spes, artigo 22.
[54] Id. cf. infra § 11.
[55]Platão. Diálogos, Fédon. Porto Alegre: Globo, 1955.
[56]Paul Tillich. Teologia Sistemática. São Paulo: Paulinas/Sinodal, 1967, p. 142.
[57]PLATÃO. O Banquete. Porto Alegre: Globo, 1955, p. 202-212.
[58]Como a de Éfeso e Esmirna, Ap. 2,1-11.
[59]PLATÃO. Fedon, Porto Alegre: Globo, 1955, 73 a, b.
[60]AGOSTINHO. De Civitate Dei, X, 4-6. Paris: Opera onmia, 1838.
[61] Rm. 5, 20.


segunda-feira, 1 de março de 2010

O sentido e a dimensão ontológica da experiência religiosa

                    José Luongo da Silveira

     Desde o início, o homem apresenta-se como um animal de sinais e símbolos, de signos significantes que realizam a mediação entre o mundo “visível e funcional e o invisível e modelar”, entre o vivenciado e o imaginário. Os grandes símbolos são criados ou descobertos pelo homem e permanecem no horizonte da humanidade como estruturas ontológicas subjacentes, incapazes de serem desveladas inteiramente. Essas estruturas ontológicas geram sentimentos de segurança e de auto-identidade, situando-se no plano do inconsciente.
    “A segurança ontológica é uma forma, mas uma forma muito importante, de sentimentos de segurança [...] A expressão se refere à crença que a maioria dos seres humanos têm na continuidade de sua auto-identidade e na constância dos ambientes de ação social e material circundantes [...] a segurança ontológica tem a ver com o ‘ser’ ou, nos termos da fenomenologia, ‘ser-no-mundo. mas trata-se de um fenômeno emocional ao invés de cognitivo, e está enraizado no inconsciente”.(GIDDENS, A. As Conseqüências da Modernidade. São Paulo: UNESP, 1991, p. 95).
      Entre esses grandes símbolos se situa o fenômeno religioso, algo que se encontra no imaginário comum de todos os povos, tempos e lugares. O fenômeno religioso interage com o sentido da vida e do mundo e se apresenta à consciência como uma construção da imagem do ser, algo inserido num contexto relacional que se articula para a formação de uma dimensão axiológica dentro das relações de tempo e espaço. A intercomplementaridade do mundo interior e exterior dá sentido à vida das pessoas e constituem-se num corpo de verdades que determina o seu agir e o seu topos no mundo. O sujeito epistemológico responsável pela formação das estruturas cognitivas realiza a função de re/construção da realidade e marca o nível de interação mental entre o mundo funcional e o mundo modelar. Na verdade, os símbolos religiosos são semióticos, exprimem o mistério, o desconhecido, trata-se de “um corpo distante de conhecimento [...] uma visão dinâmica da significação enquanto processo”.
      O fenômeno religioso constitui a primeira e original leitura do mundo, fez parte de todas as culturas cuja relevância resulta do fato inconteste de sua recorrente atualidade. E quando o homem moderno se satura da fragilidade das sínteses científicas, que não respondem o sentido da vida, volta a abrigar-se na fé. A fé renasce e avança no mundo contemporâneo, apesar das suas ambigüidades.
    “Já que religião é a auto-transcendência da vida no reino do espírito, é na religião que o homem começa a busca da vida sem-ambigüidade e é na religião que ele recebe a resposta. mas, a resposta não se identifica com a religião, já que a própria religião é ambígua. A realização da busca da vida sem-ambigüidade transcende qualquer forma ou símbolo religioso no qual ela se expressa. A auto-transcendência da vida nunca atinge incondicionalmente aquilo rumo ao qual transcende, embora a vida possa receber sua auto-manifestação na forma ambígua de religião”.(TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. São Paulo: Paulinas, 1967, p. 467).
    A linguagem inconsciente do mistério, algo que está mais além (o anda não) se constitui numa ordem simbólica, num campo aberto a outros campos de sentido. Por isso, nunca se esgotam as possibilidades de interpretação dos símbolos religiosos, eles são arquétipos com cunho transpessoal e estão na raiz da nossa experiência existencial. segundo Jung:
    "It is impossible to give an exact definition of the archetype, and the best we can hope to do is to suggest its general implications by "talking around" it. for the achetype represents a profound riddle surpassing our rational comprehension: (...) there is some part of its meaning that always remains unknown and defies formulation. consequently a certain element of the "as if" must enter any interpretation”.(JUNG, G. Complex/Archetype Symbol in the Psychology of C. G. London: Routledge & Kegan Paul, 1959, p. 31).
      O cristianismo e as grandes religiões não se contentam em recorrer somente à experiência religiosa, há o kérygma de uma fé encarnada na história. Existe um momento inicial, focal, de construção da fé numa comunidade específica e que se sedimenta ao longo da história desse povo, a exemplo do povo hebreu. Com base nessa constatação, o fenômeno religioso deixa de ter uma dimensão geral, indeterminada, e afasta-se do resultado de uma iluminação individual, para expressar algo que nasce numa comunidade, na qual a revelação se fez sentir – a experiência da fé. esse marco, prenhe de historicidade, traz a fé à esfera de cognição, contudo, o seu princípio arquitetônico transcende as dimensões espácio-temporais.
    Agostinho de Hipona traduz essa dualidade entre a historicidade e a transcendência da fé revelada, dizendo: “através da luz da razão natural e da revelação divina que se manifestam as exigências e os apelos da sabedoria eterna”. Por conseguinte, a revelação pressupõe a existência da razão, há um “ponto de conexão”, porque só o ser racional pode ser iluminado pela fé. Contudo, a razão chega somente aos umbrais da revelação, não há como a estrutura cognitiva possa ultrapassar os marcos históricos e penetrar na natureza da fé revelada. A fé não pode ser atingida pela lógica racional, porque pressupõe uma iluminação espiritual para aclarar o mysterium fascinans da revelação. Esse é o ponto de discórdia entre a fé e a razão, ou seja, a compreensão de que a fé precede à razão.
    A modernidade pensa que superou o dualismo entre o espírito e a matéria, o sagrado e o profano, negando o sagrado, como um enxerto artificial que se insere na realidade da vida. A modernidade esqueceu que o sagrado não é dist do cotidiano, não é um não-mundo ou um antimundo.
   “O drama da nossa modernidade é que ela se desenvolveu lutando contra a metade dela mesma, fazendo a caça ao sujeito em nome da ciência, rejeitando toda a bagagem do cristianismo que vive ainda em descartes [...], (destruindo) a herança do dualismo cristão e as teorias do direito natural que haviam provocado o nascimento das declarações dos direitos do homem e do cidadão nos dois lados do atlântico”.(TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 219).
   Quando santo agostinho, o maior pensador ocidental da alta idade média, diz que a fé precede a razão, está querendo dizer que há um ponto de conexão, aonde a razão não chega sozinha. Que o homem necessita da sensibilidade, da emoção e do mistério, tanto quanto da razão. É impossível alcançar uma definição exata dessa fé que ilumina a razão, o melhor que pode fazer é sugerir uma abordagem em torno do tema, porque seu sentido permanece intangível.
    Quando aborda o lume espiritual, Santo Agostino refere-se a algo muito próximo da intuição originária de Husserl, dizendo que “a fé é a lâmpada da razão”, propiciando assim a discussão entre os dois elementos. a diferença entre a intuição e a fé torna-se sutil, ao levar-se em conta que ambas globalizam o real de modo direto e imediato. Contudo, a intuição pode ser empírica (experiência sensorial) e racional, enquanto que a fé escapa à lógica da compreensão discursiva e intuitiva. A intuição situa-se nas imediações da fé, pelas características aproximativas entre a apreensão total da experiência intuitiva e o compromisso último, imediato, direto e total da fé.
  A fé pertence ao campo da teologia e, nesse contexto, é definida como dom gratuito e sobrenatural, testemonium spiritus sancti internum, embora não seja autoprojeção do eu e não possa ser alcançada pelo raciocínio discursivo, intuitivo ou estados emocionais. Esses processos podem estar presentes, mas silenciam quando a fé mergulha em seu estado próprio de abandono e auto-entrega.
   A fé, sobretudo a fé cristã, apresenta-se de modo paradoxal. ela teima em chegar à vitória final depois do fim da vida terrena. É “o sucesso prometido além de todos os fracassos”. A fase escatológica da fé, a sua esperança sobrenatural, ou a dialética entre a morte e o mundo vindouro, torna-se incompreensível à razão.
   O sentido e a dimensão ontológica da experiência religiosa consiste especificamente na possibilidade de uma compatibilização, ou uma aliança entre a facticidade e a transcendência. Contudo, essa síntese satisfatória, a conciliação entre o sagrado e o profano, torna-se difícil. corre-se duplo risco, de um lado, o
   “[...] estreito transcendentalismo sobrenaturalista e alienante, totalmente desconexo com o aqui e agora; por outro lado, o imanentismo secularista, essa pura facticidade foi responsável pelo caráter dramático da desesperança desse final de milênio”.(SILVEIRA, José Luongo da. Noções Preliminares de Filosofia do Direito. Porto Alegre: Fabris Editor, 1998, p. 233).
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CRUBELLIER, M. Sens de L’Histoire et Religion. Paris: Esclée de Brouwer, 1957, p. 187.
DEELY, John. Semiótica Básica. São Paulo: Ática, 1990, p. 40.
MAGALHÃES, Rui. Textos Hermenêuticos. Porto: Res-Editora, s/d, p. 7
JUNG, G. Complex/Archetype/Symbol in the Psychology of C. G. London: Routledge & Kegan Paul, 1959, p. 31.
GIDDENS, A. As Conseqüências da Modernidade. São Paulo: UNESP, 1991, p. 95.
GUSTAF, Aulén. A Fé Cristã. São Paulo: Aste, 1965, p. 97.
LEPARGNEUR, Hubert. Espenrança e Escatologia. São Paulo: Paulinas, 1974, p. 60.
MONDIN, Battista. Antropologia Filosófica: História, Problemas e Perspectiva. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 8-13.
SANTO AGOSTINHO. in Enarratio in Psalmum, LXII 16: CCL 39).
__. De Civitate Dei, Livros XV, XVI, XII e XVIII, Paris: Opera Omnia, 1838.
__. Confissões. Livro XI. Coleção Patrística 10. São Paulo: Paulus, 1997).
SILVEIRA, José Luongo da. Noções Preliminares de Filosofia do Direito. Porto Alegre: Fabris Editor, 1998, p. 20.
TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. São Paulo: Paulinas, 1967, p. 467.
TOURAINE, Alain. Crítica da Modernidade. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 219.
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* Vide o idealismo fenomenológico-transcendental de Husserl (HUSSERL, El Idealismo Fenomenológico. Buenos Aires: Rev . do Ocidente, 1931, p. 8 a 77).
* Subjetivismo axiológico de Ortega y Gasset, Meinong, Chistian von Ehrenfels, etc. (Vide NADER, Paulo. Filosofia do Direito. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 49).
* JUNG, G. Complex/Archetype/Symbol in the Psychology of C. G. London: Routledge & Kegan Paul, 1959, p. 31. (“É impossível alcançar uma definição exata de arquétipo; e o melhor que podemos fazer é sugerir as suas implicações gerais, estabelecendo uma abordagem ‘em torno do tema’, porque o arquétipo representa um enigma profundo, que ultrapassa a nossa compreensão racional: (...) uma parte do seu sentido permanecerá sempre intangível e avessa à formulação. Conseqüentemente, um certo elemento de ‘como se’ comporá, necessariamente, qualquer interpretação”. Tradução livre de Luiz José Veríssimo).
Kérigma: de Keryx, palavra grega que significa mensageiro, arauto que proclama a Boa Nova, pregação original cristã.
* SANTO AGOSTINHO explica que a Providência se revela ao homem “através da luz da razão natural e da revelação divina que manifestam as exigências e os apelos da sabedoria eterna” (in Enarratio in Psalmum, LXII 16: CCL 39).
* Sobre a relação ente a fé e a razão, vide a Carta Encíclica Veritais Splendor. Papa João Paulo II, São Paulo: Paulinas, 1993, p. 75 e ss.
* Santo Agostinho. Confissões. Livro XI: “O vosso Verbo é esta mesma razão e princípio de todas as coisas o qual também nos fala interiormente”. (Vide Santo Agostinho. Confissões. Coleção Patrística 10. São Paulo: Paulus, 1997).
* Seguindo a concepção platônica, Santo Agostinho divide o conhecimento em conhecimento espiritual e conhecimento racional. (Vide SANTO AGOSTINHO. De Civitate Dei, Livros XV, XVI, XII e XVIII, Paris: Opera Omnia, 1838).
* Isaías, 7: 9, LXX; Em Santo Agostinho, não há nenhum absurdo ou “credo in absurdum” quando afirma que a fé é uma condição da racionalidade, “nenhuma criatura, conquanto racional ou intelectual, é iluminada de si mesma, ou por si mesma, mas é iluminada ao participar da verdade eterna”. (in: Psal. 119, Serm. 23, 1).
* O mundo do espírito, como uma das dimensões da vida. Terminologia análoga para diferentes povos: para os latinos spiritus , para os estóicos